Equador - A volta do verde E-mail
Qua, 10 de Março de 2010 12:29

25/02 a 08/03/2010

Realmente só percebemos o quanto o verde das árvores, matas e arbustos nos faz falta depois de reencontrá-los. A empolgante beleza seca, cenário predominante da costa do Pacífico, fez esquecer-nos de como é bom passar por uma estrada que recorta diferentes tons de verde. E isso, encontramos no interior do Equador. E muito.

A saída do Peru e a entrada no Equador foram muito tranquilas. Fronteiras muito vazias, sem demoras. O carimbo de permissão para a entrada do Pezão foi dado pelo Exército Equatoriano. Sem grandes celeumas, o milico nos pegou pelo braço e fomos para o interior do prédio para fazer a burocracia. Um erro do figura camuflado faz valer a pena transcrever o diálogo em portunhol:

(Nota do autor: obviamente, nosso espanhol vem melhorando a cada dia. Não por uma capacidade extraordinária de aprendizado lingüístico, mas por mera absorção osmótica. Afinal, já são quase dois meses em ex-colônias espanholas. Mas o mais importante neste relato é manter o básico do portunhol, dado o efeito humorístico) 

Voltando ao milico... Entreguei o documento do Pezão.

- Qual es la marca e lo modelo del coche?

Pergunta pertinente, pois está escrito somente “LR/Defender” no documento:

- Marca, Land Rover, modelo, Defender.

- Hum...

Fomos em frente. Papel pra cá, pra lá, caminhando atrás dele... Carimbos. Ficamos super contentes com um último e bem-vindo “- Tudo cierto” e fomos embora. Depois das fainas proporcionadas pela polícia peruana, um “pode ir”... De graça??! Excelente!

A Du, precavida, acertadamente foi dar uma conferida no documento e, espantadíssima, me perguntou: “Que marca de carro é essa: Land Robert??!!” Eu pulei pra trás!... Meu Deus! O gênio das forças armadas errou! Por um segundo me passou pela cabeça voltar e pedir pra consertarem, mas a idéia logo sumiu e pensei: se algum policial nos parar, pedir os documentos e perguntar: “Que marca es lo vehículo?” Responderei: “És um legítimo Land Robert!!”. Se ele perceber o “Land Rover” escrito no capô, falarei que é um erro de fábrica, porque, na verdade, “es un Land Robert!!”.

Seguimos viagem, no nosso equipadíssimo Land Robert, rumo aos Andes equatorianos. Rapidamente o cenário transformou-se por completo. A areia deu lugar à mata, e o ar seco, ao clima de chuva. Começamos a subir em direção ao nosso primeiro destino, Cuenca, uma cidade muito bem falada e tida como uma das mais bonitas do Equador. No caminho, várias fotos e muitas, muitas bananeiras. Vibramos a cada curva na qual aparecia um grupo de montanhas verdes formando um vale lindo, que cor?, verde! Show!

Chegamos a Cuenca e fomos direto ao Centro Histórico. Fantástico! Uma cidade muito bonita, com arquitetura colonial muito bem preservada. Achamos um hotel e um estacionamento para Robert, que não gosta de dormir na rua. Quando estávamos tirando as tralhas, fomos abordados por uma “cuenqueana” gente fina que ficou empolgadíssima por sermos brasileiros, já que ela tinha um cunhado nosso conterrâneo. E dono de um restaurante brasileiro!! Ela nos colocou na hora ao telefone com o Walter. Gente muito boa também. Perguntei imediatamente se tinha feijão! Ele respondeu: “feijoada!”. Falei: “Vamos pra aí hoje mesmo!”. Fomos ao hotel, tomamos banho e partimos ansiosos pro nosso reencontro com a iguaria preta! Chegamos lá e encontramos um pequeno, e recém inaugurado, restaurante todo verde-e-amarelo! Sensacional! Fomos recebidos pelo simpático Walter como se fôssemos da família. Comemos dois pratos cada um e passamos quase três horas por lá, com o Walter à nossa mesa, em um papo que parecia ser capaz de varar a noite. Ficam aqui o muito obrigado ao Walter e os votos de sucesso ao novo restaurante, o Boca Loca! Valeu!

Logo pela manhã, no café, ficamos sabendo do terremoto no Chile... Muito ruim. Vimos imagens na televisão, mas não sabíamos a real dimensão do abalo. Passamos o dia visitando alguns museus e igrejas. Fomos a uma pequena fábrica, meio loja, meio museu, de “Chapéus Panamá”. Bem legal! Deu saudades do samba estilo Cartola e Monarco. Depois de um merecido descanso, partimos no dia seguinte com destino a Baños, outra cidade muito bem falada. No caminho, passamos nas ruínas Incas de Ingapirca, um dos complexos arqueológicos mais importantes do Equador. Já que não conseguimos ir a Machu Picchu, foi legal passarmos por lá. Era sábado, e as ruínas estavam cheias. Inclusive rolando umas apresentações de folclore local. Mais do que isso, quando nos aproximamos, vimos que estava havendo uma espécie de filmagem de um clipe... algo assim. Simplesmente bizarro! Um galã esquisito, em cima dos seus sessenta anos, começou uma cena de teórico romance, tendo por trás uma câmera em profundo close. Indescritível! Depois uma cena de dança, com o mesmo galã bailando com meninas de quinze anos. Meio constrangedor... Fomos embora e iniciamos a pernada definitiva a Baños. Tivemos nossa tarde de personagens do Saramago! Cegueira branca!! Uma neblina impressionante! Algo que só tinha visto à noite, quando uma vez atravessamos uma serra gaúcha. Ali, eram duas da tarde e nada se via! Nada mesmo! Ao lado, branco! Não dava pra ver se era um barranco ou uma ribanceira. Espelhos... Puro leite! À frente... Menos de cinco metros de visibilidade! Sinistro! Pra piorar, chuva! Reduzi a velocidade... Daqui a pouco, sumiu a sinalização da estrada! Nada de linhas ou riscos na pista. Quase paramos... Seguimos “saramagueando” por quase três horas. Foi brabeira... Com esse atraso, tivemos que abortar a chegada neste dia em Baños e parar no caminho. A melhor cidade era Riobamba. Paramos, comemos, dormimos. 

No dia seguinte, como estávamos com tempo, pois Baños estava razoavelmente perto, partimos para tentar chegar um pouco mais perto do vulcão Chimborazo, um dos picos mais bonitos da região, dispondo, inclusive, de uma reluzente neve eterna em seu topo. Iniciamos a subida e a embreagem o Pezão começou a pipocar. Ela já tinha mostrado que não estava cem por cento na véspera, com um curso vazio imenso do pedal antes de realmente acionar a embreagem. Eu tinha completado o fluido no hotel, o que tinha melhorado um pouco, mas começou a agravar na subida. Chegou a ficar com uns dois ou três centímetros de embreagem somente! Quase não dava pra passar as marchas e o pedal ficava cravado no fundo, tendo que puxar ele pra cima na marra! Duas possibilidades, ou ar no sistema, o que seria de fácil solução, ou passagem de fluido nos êmbolos dos cilindros mestre ou escravo, o que seria problema, porque era domingo e precisaríamos de um mecânico e peças. Abortamos a subida e começamos a voltar. Na descida, surpresa. A embreagem melhorou um pouco, ganhando alguns centímetros e passando o pedal a retornar sozinho. Bem, pra ela “curar” um pouco, significava que a pressão externa estava influenciando o sistema, o que aumentava muito a chance de ser a primeira hipótese, de ar no sistema, pois somente esse ar poderia sofrer influência da pressão externa. Resolvemos meter a mão na massa e fazer a sangria do sistema hidráulico. Conseguimos uma vala de troca de óleo e iniciamos o processo. Em menos de meia hora estava pronto, e a embreagem, nova! Ponto pros mecânicos!

Depois fomos pra Baños. Sem demoras, sem neblina, chegamos na hora do almoço. A cidade de Baños é bem interessante, com aspecto meio aventureiro. Mini-bugres estilo aranha, motos, quadriciclos... Tudo pra alugar. Muitos passeios, muitas empresas de turismo. Bem agitado.

Durante o dia, tivemos notícia de um terremoto na costa do Equador, que fora sentido também na parte andina. Parece que Cuenca e Riobamba sentiram reflexos do terremoto. Estávamos em Riobamba na véspera!! Aconteceu como no Chile... assim que saímos, terremoto! Demos notícias que estávamos bem e bola pra frente.

À noite, partimos junto a um grupo para uma tentativa de ver as cores vermelhas de alguma movimentação do vulcão Tungurahua, que está ativo e fica nos arredores de Baños. Obviamente, furada. Não vimos nem o vulcão, quanto mais luzes vermelhas. Muitas nuvens... Valeu pela fogueira que foi feita no mirante, com um figura improvisando um show de humor pra arrecadar um qualquer. A Du aproveitou pra tirar umas fotos bem legais usando a luz da fogueira e a lua. Vale conferir.

Ficamos um dia pela região, quando conhecemos algumas cachoeiras e fomos a um zoológico. Decididamente não é dos meus programas favoritos. Os animais presos não me transmitem nenhuma felicidade. Mesmo com discursos apaziguadores, do tipo “se não estivessem aqui estariam mortos” ou “nasceram em cativeiros”, simplesmente não gosto. É como ver um barco no seco. Não combina. Vivemos experiências completamente diferentes nos dias seguintes, como vou contar à frente. 

Logo de manhã rumamos para o Leste. Seguindo a dica do amigo Walter, o objetivo era nos aprofundarmos em direção à Amazônia, chamada pelos equatorianos de El Oriente. Nosso primeiro alvo era Puyo, uma pequena cidade, já um pouco isolada, e à beira da estrada. Em Puyo, achamos uma informação turística que nos indicou fazer um programa bem diferente: seguir ainda mais a fundo e passar a noite em uma aldeia indígena! Pareceu tentador... Fomos sem pensar! 

O cenário começou a ficar bacana. Muita chuva, muita lama, do jeito que Robert, digo, Pezão (melhor parar, se não o cara se ofende!), gosta! Chegamos a uma vila indígena, chamada Indichuris, e fomos muito bem recebidos. Eles estão muito acostumados a receber turistas, que apareceram com muita freqüência durante nossa estada, e não se assustaram conosco. O Pezão foi meio novidade, mas, até aí, tudo normal! O projeto tem inclusive um site:www.comunidadindichuris.com. A aldeia é ribeirinha, então demos umas voltas bem legais pela beira do rio e depois fomos arrumar a barraca para acampar no campo de futebol deles. Como não era domingo, e conseqüentemente não era dia de jogo, pudemos fundear o Pezão próximo a uma das traves. Nossa programação nessa noite era usar a cozinha deles, gentilmente cedida, para fazer o jantar. Porém, como havia um grupo de turistas que iria fazer uma caminhada para ver jacarés, jantamos a comida indígena já pronta e fomos juntos. Mais do que ver jacarés, pois não passavam de dois pequenos pontos vermelhos ao longe, foi muito legal andar no meio da mata durante a noite com uns sete ou oito cachorros. Divertidíssimo! Fizemos umas filmagens muito bem humoradas! 

O momento áureo da noite foi antes do passeio, durante a espera pelo jantar, no primeiro contato com um pequeno macaco, na verdade uma fêmea. A Du ficou apaixonada e não largou a pequena mascote. Fotos e filmagens igualmente divertidas.

No dia seguinte fomos com um guia local, o Carlitos, para uma volta de canoa. Uma canoa bem rústica, no mesmo estilo das usadas pelos índios brasileiros. Foi quase uma hora de passeio pelo rio Puyo/Pastaza. Um contato bem legal com a região. Depois, preparamos nosso almoço na cozinha deles e tivemos o Carlitos como convidado. Pra desespero dele, devido ao sarro dos demais da comunidade. Carlitos contou que a vida lá é bem dura... Pediu ajuda, servindo até emprego no Rio de Janeiro! Uma certa pena...

Saímos da comunidade logo após o almoço, seguindo o caminho de volta a Puyo, para depois nos direcionarmos a Tena, nossa próxima cidade. No caminho, paramos em um lugar especial, chamado Paseo los Monos. Trata-se de um projeto fantástico, que foi iniciado por um casal de suíços, de recuperação de macacos. Eles levam para lá macacos que estavam em cativeiros clandestinos, ou sendo traficados, e tentam formar um grupo para reintegração na floresta. O mais legal é que eles ficam completamente soltos! Sem jaulas, sem grades! O contato foi sensacional! A Du ficou o tempo inteiro com um ou dois macacos à tiracolo! Conversamos bastante com o responsável, conhecido como Jayme de los Monos, e partimos para uma incrível volta pela propriedade com a impressionante escolta de uns trinta macacos! Fora um quati, dos mais presepeiros! Foi sensacional! Várias fotos e vídeos para guardarmos com carinho.

Seguimos para Tena sem grandes novidades. Viagem tranqüila. Dormimos por lá e partimos no dia seguinte para a capital equatoriana, Quito. No caminho, mais um programa diferente. Paramos, perto da cidade de Archidona, nas cavernas de Jumandy. Entramos na caverna novamente acompanhados pelo indispensável guia e, desta vez, munidos de lanternas de alpinistas na testa. Muito diferente. Sei que é comum no Brasil, mas pra mim foi completa novidade.

Chegamos em Quito numa boa, em um viagem bem rápida. Apesar de, quando não estarmos subindo, estarmos descendo... Mas o Pezão já está completamente acostumado com as serras do Andes. O bicho está tão pesado, e inclina tanto nas curvas, que eu brinco com a Du dizendo que a gente não dirige o Pezão, e sim “navega”! Ou seja, o Pezão não faz curva, e sim “camba”! Ou, como diz meu amigo Ricardo Silveira, “dá um bordo”! 

De “bordo em bordo” chegamos a Quito. Uma cidade bem interessante, com um centro histórico muito bonito, mas com suas mazelas de grande centro latino-americano. Recebemos inúmeros conselhos para termos precaução com roubos e assaltos, por exemplo. Faz parte. Paramos no bairro que, aparentemente, seria o mais legal e turístico, o Mariscal. Foi uma estadia bem tranqüila e aproveitamos para dar uma quebrada no ritmo, ficando por quatro noites. 

No sábado, partimos para uma cidade próxima, Otavalo, para conhecer um famoso mercado de rua. A estrada, de mão dupla, estava bem movimentada, o que nos fez vivenciar momentos de pura emoção. O equatoriano dirigindo na estrada é simplesmente louco! Acho que, por haver muitas subidas, o ímpeto equatoriano para ultrapassar torna-se quase selvagem! Eles devem achar que quem fica atrás de um caminhão em uma subida é um pateta... Ultrapassagens pelo acostamento do lado direito, ou mesmo ultrapassagens das ultrapassagens pelo acostamento da outra pista, não foram raras! O Pezão ficou indignado e deu uns dois “chega-pra-lá” em uns nanicos... Linhas contínuas na pintura da estrada não significavam nada... Impressionante! Chegamos lá e realmente a cidade transforma-se em um imenso mercadão. Principalmente de artesanato. Há também uma parte dedicada a um mercado de animais. Chegamos nesse um pouco tarde, já no fim da manhã, e acho que não pegamos o melhor da festa. De uma forma geral, achamos que seria um pouco mais interessante, pela fama do local. Mas valeu.

De volta a Quito. No domingo, a principal rua do bairro fica fechada para o trânsito e as bicicletas tomam conta do lugar. Pegamos nossas magrelas! Fomos ao Parque La Carolina, onde o pessoal local se diverte em campos de futebol, vôlei e basquete, além de imensos gramados. Tudo bem animado. Ficamos um pouco assustados durante a leitura de um jornal, que falava que a cidade de Quito estaria sob risco de um terremoto de maiores proporções a qualquer momento... Meio alarmista demais, mas não é legal de se ler.

Partimos na segunda-feira cedo para a Colômbia. Uma viagem pacata, sem pressa. Sobes e desces bem bonitos. Na chegada à fronteira, um mega trânsito! Filas e filas de caminhões abarrotados de carros novos e outros produtos, além de centenas de carros de passeio. Pensamos que seria alguma operação linha dura em uma das fronteiras... Que nada! Não passava de uma obra de recapeamento do lado colombiano. Quase três horas pra passar nas duas fronteiras, sendo mais de uma no trânsito. Mas ambas as burocracias correram sem estresse, e ingressamos em mais um país do nosso roteiro... Dessa vez checamos item por item o documento de entrada do Pezão. Vários erros consertados! Pessoal muito “roda-presa”!!

Em função do atraso, paramos em Ipiales, a cidade fronteiriça. Não é o ideal, mas recebemos vários conselhos de não andarmos à noite na estrada, então não arriscamos. O primeiro contato com o povo colombiano foi muito bom. Vamos ver mais pra frente...

Saímos do Equador com uma excelente impressão. Um povo bem orgulhoso do seu país e, aparentemente, mais leve. Isto é visível nos diversos cartazes do que chamam de “La Revolución”, onde palavras de ordem nacionalista convocam o povo a ter orgulho do seu país e a investir nele. Outro indício de maior desenvolvimento é a presença constante de placas de incentivo à preservação ambiental. Muito legal! Não me lembro de ter visto nenhuma no Peru, por exemplo. Os problemas urbanos do dia-a-dia não fogem à regra dos demais vizinhos, possuindo alguns dos mesmos personagens, como pedintes nas ruas e andares preocupados à noite... Mas o saldo é bem positivo e nos divertimos um bocado!

Este nosso projeto, destacando-se aqui a parte de divulgação, o site, obteve um efeito muito legal. Inúmeras pessoas que não tínhamos contato acabaram aparecendo! Muito bom mesmo! Para mim, estão sendo muito especiais os papos com o pessoal de Niterói, que tinha perdido totalmente o contato desde quando pulei a poça e fui morar no Rio, há mais de dez anos... Um abraço especial para Godô, Tchaca, Xuxa e, recentemente, Pedrão! Parece a enumeração de uma gangue, mas são alguns dos meus grandes amigos! Abraços!

Vamos em frente!










 
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